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Por Mônica Vitória Conexão Professor (CP) – Ainda somos um país que lê pouco. Como e por que os professores devem incentivar os alunos à leitura? Tânia Zagury – O professor sozinho não pode fazer milagre, é claro. Mas ele, às vezes, é a única representação positiva projetável na criança, pois ela geralmente se vê da forma como ela é vista. A criança ou o jovem pode ser oriundo de um meio cultural ou mesmo afetivo muito pobre, de lares tumultuados, com exemplos ruins etc. Então, nesses casos, o professor é considerado o único elo do aluno com o saber, com a ciência, com a cultura. É uma espécie de líder; é um espelho de cristal para o aluno que está acostumado a se olhar num espelho de lata. O professor não deve esquecer nunca que é um promotor do crescimento pessoal e intelectual dos outros. Sendo um exemplo para o estudante, ele deve se aproximar do mundo do jovem e conduzi-lo ao caminho do conhecimento de forma gradual e atenta. A leitura deve estar sempre presente no processo. O aluno precisa perceber que o livro nos faz entender o mundo, compreender as pessoas, possibilita sonhar, viajar e emocionar. CP – Você estudou em escola pública, no Instituto de Educação Carmela Dutra. Qual foi a influência dessa passagem no trabalho que você desenvolve atualmente? Tânia Zagury – Eu sempre fui uma pessoa voltada para aspectos sociais, queria lutar contra a injustiça e a desigualdade, e dizia, desde menina, que ia ser professora. Entrei, então, no Carmela Dutra, que era especializado na formação de professores desde o ginásio. Vim de uma família de classe média baixa, portanto o caminho natural era a escola pública. Mas naquela época, a prova para estudar no Carmela era difícil. Lá, tive professores excelentes e inesquecíveis, que faziam a turma ler pelo menos um livro por mês. A escolha de um local profissionalizante em que se respirava educação o tempo todo foi decisiva para minha carreira. Hoje, sou escritora por ser educadora. Por tudo isso, valorizo muito os educadores e a escola pública. Toda a minha experiência de mais de quatro décadas de trabalho foi baseada na educação e pelo ensino público. CP – Para você, hoje, o que significa educar uma criança ou um adolescente? Tânia Zagury – Educar é um processo lento, gradual e contínuo. E nada está perdido. Acho que mesmo um adulto é passível de mudança, embora isso dependa de uma opção pessoal. Já uma criança e um adolescente são seres em construção – e não estou falando de um direcionamento para uma determinada postura ideológica. É preciso que o jovem entenda que ele é dono de um livre arbítrio e que a decisão que ele toma tem consequências, para ele mesmo, para a família ou para a sociedade. O professor tem um papel substancial nisso, fazendo o aluno pensar, e, a partir do pensar, tomar as decisões certas para que ele seja feliz. E ser feliz não significa fazer só o que quer, mas sim fazer o que é bom sem prejudicar os demais nem a si próprio. CP – Sendo uma defensora do estabelecimento de regras e limites, você acredita que a postura dos professores com seus alunos deve ser similar à adotada pelos pais em casa? Tânia Zagury – Deve haver uma coerência. Tenho um livro que fala exatamente sobre a parceria entre pais e professores – “Escola sem conflito”. Não é que a escola e a família devem educar exatamente igual, até porque as funções são diferentes. Ambas são congruentes, paralelas e têm seu valor fundamental, mas são complementares. A família tem uma função socializadora básica, é a primeira instância socializadora da criança; e a escola completa esse papel. No momento, temos vivido muitos casos de ausência da família, pela desestruturação decorrente da vida moderna, pelo fato de que hoje pai e mãe trabalham fora o dia todo e têm menos tempo para conviver com os filhos. Por isso, a escola assume uma importância ainda maior atualmente, em especial quando os pais abrem mão do seu papel na construção de limites. Sobre a questão do limite, eu comecei a abordar o assunto no início dos anos 90, uma época em que a psicanálise se popularizava, e se defendia tanto a liberdade, que era comum a idéia de que qualquer limite imposto à criança causaria problemas emocionais e traumas. Hoje, temos um grande número de jovens que se marginaliza ou que não possui concentração para aprender, e isso tem uma ligação direta com a falta de limites. Sem limites, uma criança não consegue nem parar para ouvir o que o professor diz. É preciso que os pais reencontrem o seu papel de geradores da ética, de formadores primários da cidadania. O professor, paralelamente, como sempre foi, vai reforçar essa cidadania, ensinando a se comportar e a se respeitar. As regras não causam nenhum mal à criança, muito pelo contrário – a não ser que sejam regras impostas sem razão nem motivo. CP – Você inaugurou uma sala de leitura em Japeri, um dos municípios mais pobres do Rio de Janeiro. Qual é a importância de se criar esse tipo de espaço numa região tão carente? Tânia Zagury – É evidente que salas de leitura nunca são bastantes o suficiente em lugar nenhum, nem mesmo em países de primeiro mundo. Mas quanto mais carente é a realidade educacional de uma região, mais bem vinda e importante é qualquer iniciativa como esta. Às vezes, é o marco inicial de um processo. E também fico muito feliz de poder dar meu nome à sala. Trouxe, inclusive, revistas pedagógicas para compor o acervo da escola. Costumo dizer que o saber é uma das poucas riquezas que quanto mais a gente dá, mais a gente tem.

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